Educação Superior Comentada | Políticas, diretrizes, legislação e normas do ensino superior

Ano 1 • Nº 19 • De 19 a 25 de julho de 2011

25/07/2011 | Por: Celso Frauches | 99045

EDUCAÇÃO SUPERIOR: FREQUÊNCIA DE ALUNOS E PROFESSORES

Recebo, com razoável frequência, consulta de gestores acadêmicos de instituições de educação superior (IES) sobre diversas questões relacionadas ao abono de faltas e aos exercícios domiciliares ou regime especial. Há leis que tratam do assunto. Este é o tema do artigo desta semana.

Na LDB, o § 3o do art. 47 da Lei nº 9.394, de 1996, diz que “é obrigatória a frequência de alunos e professores, salvo nos programas de educação a distância”.

No ensino presencial, antes da LDB de 1996, era exigida, para os alunos, a freqüência mínima de 75% das aulas e atividades programadas. Ao aprovar os estatutos e regimentos das IES, o Ministério da Educação tem exigido esse percentual mínimo, para atender ao disposto no Parecer CES/CNE nº 282/2002, homologado pelo ministro da Educação.

Na educação superior não há abono de faltas, exceto nos seguintes casos, expressamente previstos em lei:

a)     Alunos reservistas. O Decreto-lei nº 715, de 1969, em vigor, assegura o abono de faltas para todo convocado e matriculado em Órgão de Formação de Reserva ou reservista que seja obrigado a faltar às suas atividades civis por força de exercício ou manobra, exercício de apresentação das reservas ou cerimônias cívicas, e o Decreto Nº 85.587, de 1980, estende essa justificativa para o Oficial ou Aspirante-a-Oficial da Reserva, convocado para o serviço ativo, desde que apresente o devido comprovante. A lei não ampara o militar de carreira. Suas faltas, mesmo que independentes de sua vontade, não terão direito a abono, por força de lei;

b)     Aluno com representação na Conaes.  O estudante que tiver representação como membro da Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes), nos termos do art. 7º, § 5º, da Lei nº 10.861, de 2004, que institui o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), tem direito a abono de suas faltas. As IES “deverão abonar as faltas do estudante que, ..., tenha participado de reuniões da Conaes em horário coincidente com as atividades acadêmicas”.

A legislação vigente permite, por outro lado, tratamento excepcional para os estudantes que não possam frequentar as aulas, por tempo determinado, com base no Decreto-lei nº 1044, de 1969, em vigor, e na Lei nº 6.202, de 1975. Não se trata de abono de faltas, mas do cumprimento do “trabalho acadêmico efetivo” em regime domiciliar. O estudante não frequentará as atividades acadêmicas na IES, mas terá que executar os trabalhos acadêmicos, sob supervisão docente, onde estiver internado.

O Decreto-lei Nº 1.044, de 1969, dispõe sobre o tratamento excepcional para os alunos portadores das afecções que indica, podendo atribuir-lhes, como compensação da ausência às aulas, exercícios domiciliares com acompanhamento da instituição de ensino, sempre que compatíveis com o estado de saúde do estudante e as possibilidades do estabelecimento. Eis o texto do referido decreto-lei:

Art. 1º São considerados merecedores de tratamento excepcional os alunos de qualquer nível de ensino, portadores de afecções congênitas ou adquiridas, infecções, traumatismo ou outras condições mórbidas, determinando distúrbios agudos ou agonizados, caracterizados por:

a) incapacidade física relativa, incompatível com a freqüência aos trabalhos escolares; desde que se verifique a conservação das condições intelectuais e emocionais necessárias para o prosseguimento da atividade escolar em novos moldes; 

b) ocorrência isolada ou esporádica;

c) duração que não ultrapasse o máximo ainda admissível, em cada caso, para a continuidade do processo pedagógico de aprendizado, atendendo a que tais características se verificam, entre outros, em casos de síndromes hemorrágicos (tais como a hemofilia), asma, cartide, pericardites, afecções osteoarticulares submetidas a correções ortopédicas, nefropatias agudas ou subagudas, afecções reumáticas, etc.

Art. 2º Atribuir a esses estudantes, como compensação da ausência às aulas, exercício domiciliares com acompanhamento da escola, sempre que compatíveis com o seu estado de saúde e as possibilidades do estabelecimento.

Art. 3º Dependerá o regime de exceção neste Decreto-lei estabelecido, de laudo médico elaborado por autoridade oficial do sistema educacional.

Art. 4º Será da competência do Diretor do estabelecimento a autorização, à autoridade superior imediata, do regime de exceção.

Fica a pergunta, que não quer calar: que doença é essa – “etc.” – que encerra a redação da alínea “c”?

É reconhecido na redação parlamentar que nenhuma norma legal deve conter exemplos ou a forma genérica do “etc.”, como citado decreto-lei, dos “anos de chumbo”.

Os exercícios domiciliares, como forma de compensação da ausência às aulas regulares, deve ter o acompanhamento de professor designado pelo gestor competente da IES, nos termos de seu estatuto, regimento geral, regimento ou regulamento, “sempre que compatíveis com o (seu) estado de saúde e as possibilidades” da instituição. Cada IES deve, portanto, ter regulamento próprio para os exercícios domiciliares, que não são concedidos automaticamente. Não basta o aluno apresentar atestado médico que comprove de que é portador de “afecções congênitas ou adquiridas, infecções, traumatismo ou outras condições mórbidas, determinando distúrbios agudos ou agonizados”. Nos termos do regulamento da IES, os exercícios domiciliares poderão ser concedidos, desde que compatíveis com o estado de saúde do estudante e as possibilidades da instituição. O gestor pode indeferir o pedido, justificadamente, de acordo com os ordenamentos internos da IES.

A Lei nº 6.202, de 1975, atribui à estudante em estado de gestação o regime de exercícios domiciliares, instituído no Decreto-lei nº 1.044, de 1969. Eis o texto da lei:

Art. 1º A partir do oitavo mês de gestação e durante três meses a estudante em estado de gravidez ficará assistida pelo regime de exercícios domiciliares instituído pelo Decreto-lei número 1.044, 21 de outubro de 1969.

Parágrafo único. O início e o fim do período em que é permitido o afastamento serão determinados por atestado médico a ser apresentado à direção da escola.

Art. 2º Em casos excepcionais devidamente comprovados mediante atestado médico, poderá ser aumentado o período de repouso, antes e depois do parto.

Parágrafo único. Em qualquer caso, é assegurado às estudantes em estado de gravidez o direito à prestação dos exames finais.

Art. 3º Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário.

A partir do 8º mês de gestação e durante três meses a estudante ficará assistida pelo regime de exercícios domiciliares. Esse período, “em casos excepcionais”, poderá ser ampliado, antes e depois do parto, com base em atestado médico, assim como o início e o fim do período de afastamento.

A Lei nº 6.202, de 1975, que atribui à estudante em estado de gestação o regime de exercícios domiciliares instituído pelo Decreto-lei nº 1.044, de 1969, diz, no parágrafo único, art. 2º, que, “em qualquer caso, é assegurado às estudantes em estado de gravidez o direito à prestação dos exames finais (grifei).  

A aluna em estado de gravidez amparada pela Lei nº 6.202, de 1975, e os beneficiados pelo Decreto-lei nº 1.044, de 1969 estão sujeitos às provas, exames, testes aplicados durante o período em que estiverem de licença e submetidos ao regime de exercícios domiciliares. Essas aferições da aprendizagem devem ser inseridas no programa ou plano dos “exercícios domiciliares”, se os mesmos forem deferidos. A participação nos “exames finais”, quando houver, caso a estudante “não tenha realizado os exames parciais ou tenha obtido nota zero nos mesmos”, é permitido somente à estudante em estado de gestação.

Os exercícios domiciliares, em ambos os casos, devem atender, ainda, ao processo de aprendizagem. As atividades práticas, realizadas em laboratórios ou em campo, ou estágios profissionais, realizados em situações reais, não podem ser contemplados nos exercícios domiciliares, pois essas atividades não têm como ser efetivadas em domicílio ou no estabelecimento em que esteja internado o aluno ou a aluna. Nessas situações, o trancamento de matrícula é a medida adequada, que deve ser recomendada ao estudante.

Nesses dois casos não há abono de faltas. A presença às aulas é substituída por exercícios domiciliares, que devem ser executados durante o prazo estabelecido em atestado médico. A concessão dos exercícios domiciliares não é automática. O aluno deve requerer e a IES poderá ou não conceder, desde que a duração de tais exercícios não ultrapasse o máximo ainda admissível, em cada caso, para a continuidade do processo pedagógico de aprendizado.

O gestor acadêmico não é competente para avaliar a validade de atestado médico. Quando essa dúvida ocorrer, o gestor deve ser assistido por um perito médico ou uma comissão médica, que emitirá parecer técnico sobre o caso.

 

Estudantes Adventistas

Não há nenhuma lei ou norma federal que beneficie os alunos Adventistas do 7º Dia com abono de faltas pela ausência às aulas das 18h de sexta-feira às 18h de sábado. Caso faltem às aulas por motivos religiosos terão suas faltas registradas e poderão ser reprovados por não cumprirem o mínimo de 75% de freqüência.

Não há amparo legal para o abono de faltas por motivos religiosos. O Conselho Federal de Educação, pelo Parecer CFE nº 430/1984, referendado pelos Pareceres 15/1999, da Câmara de Educação Básica, e 336/2000, da Câmara de Educação Superior do CNE, firmou jurisprudência no sentido de que os alunos, por motivos religiosos, que não puderem comparecer às aulas, em certos dias da semana, serão considerados faltosos. Nos pareceres citados, decide-se que, por motivos de convicção religiosa – especificamente os que são “adventistas do sétimo dia” –, os alunos não podem receber tratamento diferenciado dos demais, ateus ou que professem outras religiões.

As IES confessionais Adventistas ou as que não queiram prejudicar os alunos que se enquadrem nesses casos, podem ter calendário acadêmico diferenciado ou especial, desde que atendam ao mínimo de duzentos dias letivos de “trabalho acadêmico efetivo”.

Alguns Estados têm legislado a respeito. Um exemplo é a Lei nº 12.142, de 2005, do Estado de São Paulo, que estabelece que “as provas de concurso público ou processo seletivo para provimento de cargos públicos e os exames vestibulares das universidades públicas e privadas serão realizados no período de domingo a sexta-feira, no horário compreendido entre as 8h e as 18h” e dá outras providências. Eis a lei:

Art. 1º As provas de concurso público ou processo seletivo para provimento de cargos públicos e os exames vestibulares das universidades públicas e privadas serão realizados no período de domingo a sexta-feira, no horário compreendido entre as 8h e as 18h.

§ 1º Quando inviável a promoção de certames em conformidade com o caput, a entidade organizadora poderá realizá-los no sábado, devendo permitir ao candidato que alegar motivo de crença religiosa a possibilidade de fazê-los após as 18h.

§ 2º A permissão de que trata o parágrafo anterior deverá ser precedida de requerimento, assinado pelo próprio interessado, dirigido à entidade organizadora, até 72 (setenta e duas) horas antes do horário de início do certame.

§ 3º Na hipótese do § 1º, o candidato ficará incomunicável desde o horário regular previsto para os exames até o início do horário alternativo para ele estabelecido previamente.

Art. 2º É assegurado ao aluno, devidamente matriculado nos estabelecimentos de ensino público ou privado, de ensino fundamental, médio ou superior, a aplicação de provas em dias não coincidentes com o período de guarda religiosa previsto no caput do artigo 1º.

§ 1º Poderá o aluno, pelos mesmos motivos previstos neste artigo, requerer à escola que, em substituição à sua presença na sala de aula, e para fins de obtenção de freqüência, seja-lhe assegurada, alternativamente, a apresentação de trabalho escrito ou qualquer outra atividade de pesquisa acadêmica, determinados pelo estabelecimento de ensino, observados os parâmetros curriculares e plano de aula do dia de sua ausência.

§ 2º Os requerimentos de que trata este artigo serão obrigatoriamente deferidos pelo estabelecimento de ensino.

Art. 3º As despesas decorrentes da execução desta lei correrão à conta das dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário.

As IES localizadas no Estado de São Paulo ou em outra unidade da Federação que tenha lei similar, embora integrantes do sistema federal de ensino, sujeitas às leis federais, não devem se excusar ao cumprimento dessa norma legal.

 

Estudante convocado pela Justiça Eleitoral

A lei não traz previsão expressa de abono ou justificativa de falta na hipótese de estudante que atue no processo eleitoral, durante as eleições, por convocação da Justiça Eleitoral. Dispõe o art. 98 da Lei n. 9.504, de 1997:

Art. 98. Os eleitores nomeados para compor as Mesas Receptoras ou Juntas Eleitorais e os requisitados para auxiliar seus trabalhos serão dispensados do serviço, mediante declaração expedida pela Justiça Eleitoral, sem prejuízo do salário, vencimento ou qualquer outra vantagem, pelo dobro dos dias de convocação.

Há previsão legal expressa de dispensa do comparecimento ao “serviço”, pelo dobro dos dias de convocação, e sem prejuízo de salário, remuneração ou qualquer outra vantagem para os empregados/eleitores nomeados para atuar como mesário ou em outra função no processo eleitoral.

 A lei não prevê a situação de aluno convocado para atuar como mesário. Por estar o estudante prestando serviço público relevante, cabe a cada IES, todavia, disciplinar a matéria.

 

Estudante em competições esportivas

A Lei nº 9.615, de 1998, que institui normas gerais sobre desporto e dá outras providências – a Lei Pelé – não beneficia alunos matriculados em instituições de ensino. O benefício é concedido somente a “atleta servidor público civil ou militar, da Administração Pública direta, indireta, autárquica ou fundacional, ... convocado para integrar representação nacional em treinamento ou competição desportiva no País ou no exterior”, conforme dispõe o art. 84, transcrito em seguida:

Art. 84. Será considerado como efetivo exercício, para todos os efeitos legais, o período em que o atleta servidor público civil ou militar, da Administração Pública direta, indireta, autárquica ou fundacional, estiver convocado para integrar representação nacional em treinamento ou competição desportiva no País ou no exterior. (Redação dada pela Lei nº 9.981, de 2000)

§ 1º O período de convocação será definido pela entidade nacional da administração da respectiva modalidade desportiva, cabendo a esta ou aos Comitês Olímpico ou Paraolímpico Brasileiros fazer a devida comunicação e solicitar ao INDESP a competente liberação do afastamento do atleta ou dirigente. (Redação dada pela Lei nº 9.981, de 2000)

§ 2º O disposto neste artigo aplica-se, também, aos profissionais especializados e dirigentes, quando indispensáveis à composição da delegação.

Não há, portanto, a previsão de abono de faltas ou exercícios domiciliares para o estudante-atleta.

 

Frequencia docente

A frequência dos professores às atividades acadêmicas é disciplinada nos ordenamentos internos de cada IES – estatuto, regimento geral, regimento, regulamento ou plano de carreira. Devo registrar, todavia, que a ausência do professor às aulas e demais trabalhos acadêmicos com supervisão docente, quando não substituído por outro docente, deve ensejar a reposição dessas atividades. Em qualquer hipótese, o aluno tem direito a essa reposição.