Educação Superior Comentada | Políticas, diretrizes, legislação e normas do ensino superior

Ano 1 • Nº 25 • De 20 a 26 de agosto de 2013

A Coluna do Gustavo desta semana destaca os riscos que correm a livre iniciativa e a democracia

26/08/2013 | Por: Gustavo Fagundes | 2842

OS RISCOS QUE CORREM A LIVRE INICIATIVA E A DEMOCRACIA

A adoção da figura do chamamento público como única forma de possibilitar a obtenção de autorização de funcionamento de cursos de Medicina coloca em sério risco o instituto constitucionalmente consagrado da livre iniciativa na oferta da educação, e, por conseguinte, a própria democracia.

Há alguns anos, a conduta e eventuais manifestações dos titulares do Ministério da Educação e de seus comandados deixam evidente sua postura contrária à existência do ensino privado, notadamente na esfera da educação superior.

Numa autêntica democracia, isso não seria problema algum, pois as convicções pessoais dos agentes públicos não afetariam sua atuação no exercício de seus cargos e funções públicos, porquanto a vontade desses servidores, na condução de suas atividades profissionais, por força do princípio constitucional da legalidade, é exclusivamente aquela decorrente das leis vigentes, sobretudo dos preceitos constitucionais.

Infelizmente, não é isso que vem acontecendo no País, em diversos setores, entre os quais a educação, onde o artigo 209 da Constituição Federal é rotineiramente desprezado.

Num breve escorço histórico, é fundamental registrar que a previsão constitucional de garantia à livre iniciativa está presente na ordem jurídica constitucional desde a Constituição Federal de 1946, não sendo, portanto, mera “invenção neoliberal” como costumam pregar aqueles que são contra o ensino superior privado.

A forma adotada pelo Ministério da Educação para restringir a livre iniciativa, estipulando o chamado sistema de chamamento público como única forma de possibilitar a obtenção de autorização de funcionamento dos cursos de Medicina colide frontalmente com ordenamento constitucional, pois traz, indisfarçavelmente, o viés de oferta do ensino como objeto de concessão ou permissão do poder público, o que é manifestamente incompatível com a figura da livre iniciativa, como, inclusive, já decidiu o Egrégio Supremo Tribunal Federal: 

 

EMENTA:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 10.989/93 DO ESTADO DE PERNAMBUCO. EDUCAÇÃO: SERVIÇO PÚBLICO NÃO PRIVATIVO. MENSALIDADES ESCOLARES. FIXAÇÃO DA DATA DE VENCIMENTO. MATÉRIA DE DIREITO CONTRATUAL. VÍCIO DE INICIATIVA.


1. Os serviços de educação, seja os prestados pelo Estado, seja os prestados por particulares, configuram serviço público não privativo, podendo ser desenvolvidos pelo setor privado independentemente de concessão, permissão ou autorização.

Omissis.” (ADIN nº 1.007-7 – Pernambuco, Relator Ministro Eros Roberto Grau, votação por maioria – grifamos).

 

Tratar a oferta de cursos superiores, sejam eles de Medicina ou quaisquer outros cursos, como objeto de concessão ou permissão do Estado, portanto, contraria frontalmente o ordenamento constitucional vigente, porquanto configura manifesto cerceamento do princípio da livre iniciativa.

Não é legítimo, pois, condicionar a possibilidade de obtenção de autorização para oferta de cursos superiores, exclusivamente, à delimitação do interesse do poder público, desprezando o direito de livre exercício da atividade educacional por parte das instituições legitimamente credenciadas.

O sistema de chamamento público poderia, perfeitamente, coexistir com o respeito à livre iniciativa, servindo, de forma complementar, para buscar induzir a oferta em locais onde seja identificada a necessidade mais premente.

Assim, ao mesmo tempo em que assegurada a livre iniciativa, podendo as instituições pleitear a autorização de funcionamento de cursos de Medicina (ou quaisquer outros cursos, evidentemente) de acordo com seus planejamentos institucionais, o poder público poderia, pelo sistema de chamamento público, estimular a oferta desses cursos em locais distintos e menos favorecidos, adotando procedimentos específicos para a implementação das políticas públicas de distribuição da oferta de educação superior.

O que não se pode admitir é a adoção exclusiva do sistema de chamamento público, conforme acima demonstrado!

Até porque, admitido o sistema em comento para os cursos de Medicina, e considerando o viés ideológico que equivocadamente vem conduzindo a atividade de nossos gestores públicos, o próximo passo será a adoção do chamamento público para a oferta dos demais cursos superiores, enterrando, definitivamente, a livre iniciativa e a própria democracia.

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Qualquer crítica, dúvida ou correções, por favor, entre em contato com a Coluna Educação Superior Comentada, por Gustavo Fagundes, que também está à disposição para sugestão de temas a serem tratados nas próximas edições. 


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