O novo ministro da Educação, Cid Gomes, apresentou em seu discurso de posse, proferido no dia 2 de janeiro de 2015, suas principais propostas para o Ministério da Educação (MEC). Sob a égide do lema do segundo governo da presidente Dilma Rousseff – “Brasil, Pátria Educadora”, “educação prioridade das prioridades” – ele anunciou que dentro de três meses terá um novo plano para a pasta.
Cid Gomes considera que agora o novo desafio é o da inclusão do saber, tendo em vista que “os governos Lula e Dilma, nos últimos 12 anos, por meio de políticas sociais e de segurança alimentar, garantiram a saída do Brasil do mapa da fome, promovendo a inclusão de milhões de brasileiros em melhores condições de vida”. Ao reconhecer, no entanto, as desigualdades ainda presentes no país e ao declarar a sua crença de que somente a educação pode superar esse quadro injusto, conclama a sociedade brasileira a se unir e trabalhar na construção da “pátria educadora”.
Fontes ministeriais vêm informando, e o próprio Cid Gomes tem declarado em entrevistas, que o plano completo para a pasta, referenciado pelo mérito e pela qualidade, tem como pontos básicos o atendimento às metas do Plano Nacional de Educação (PNE); a atenção e a prioridade absoluta à educação básica, particularmente ao ensino médio; o aperfeiçoamento dos mecanismos de avaliação [1] e a criação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) online.
No que se refere ao PNE a ideia é conceder especial atenção à Meta nº 12 do PNE que estabelece:
Elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior para 50% (cinquenta por cento) e a taxa líquida para 33% (trinta e três por cento) da população de 18 (dezoito) a 24 (vinte e quatro) anos, assegurada a qualidade da oferta, e expansão para, pelo menos, 40% (quarenta por cento) das novas matrículas, no segmento público.
A implantação dessa meta significa aumentar, no período de dez anos, 50% da taxa bruta de escolarização e mais do que dobrar a taxa líquida de escolarização desse contingente populacional.
Cid Gomes defende também que seja feita a Lei de Responsabilidade Educacional para regular o PNE e estabelecer responsabilidades federais, estaduais e municipais.
Com a declarada primazia a ser conferida por ele à educação básica, o ministro conclamará professores, mestres das escolas públicas e, principalmente, membros do corpo técnico do MEC com o propósito de ampliar o atendimento às crianças até 3 anos de idade, por meio da construção de novas creches; da universalização do acesso de crianças de 4 e 5 anos à pré-escola; da implantação do Pacto Nacional de Alfabetização na Idade Certa, baseado na colaboração entre estados e municípios, como política para todo o país, e ampliação do número de escolas em tempo integral.
A preocupação com o ensino médio tem sido um aspecto recorrente nos pronunciamentos do Ministro. Em nenhum dos ciclos de educação básica a estagnação nos indicadores de qualidade de ensino é tão clara como neste nível de ensino. Um número crescente de estados não alcança as metas estabelecidas pelo Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb), cuja média nacional estacionou em 3,7. As médias são também ruins no ensino privado, cuja meta foi cumprida pela última vez em 2007.
Para ele o papel mais relevante e o maior desafio do MEC é promover a articulação com os sistemas estaduais e municipais de ensino em busca da qualidade na educação básica.
O ministro reconhece, no entanto, – e cita como exemplos – o esforço que vem sendo feito por várias unidades da federação (São Paulo, Acre, Goiás e Minas Gerais) para reverter esse quadro, visando tornar essa etapa do ensino mais atrativa e reduzir as taxas de evasão, com a adoção de programas de ensino integral e da adoção de currículos mais flexíveis e voltados para os projetos de vida dos jovens. O ministro enfatiza também os bons resultados do Ideb no ensino médio em Pernambuco, que estão comprovadamente relacionados ao modelo de ensino integral.
Para o ministro a situação exige mais do que verbas. Mesmo diante da perspectiva de recursos crescentes para a educação com a aprovação do PNE, será preciso definir uma base curricular nacional e uma mudança nos cursos de Pedagogia para torná-los mais práticos e menos teóricos, aperfeiçoar as avaliações existentes, definir com mais clareza as metas que se pretende alcançar e, sobretudo, atrair os jovens brasileiros para a carreira do magistério. O ministro reconhece a existência de uma discussão no interior do MEC, anterior à sua chegada, que é a do piso salarial dos professores, e com a qual ele se compromete. “Temos dez anos para fazer com que os salários dos professores, profissionais de nível superior de pedagogia, cheguem à média dos salários dos professores de nível superior de outras profissões.”
Um dos programas que entusiasma o ministro é a avaliação dos diretores de escolas, “medida financeiramente mais viável do que avaliar todos os professores da rede pública de ensino”. Para tanto, o MEC lançou no dia 4 de fevereiro uma consulta pública [2] na internet para saber o que a população brasileira – pais, professores, gestores, alunos, comunidade escolar, academia, estudiosos e sociedade – pensa sobre a função do diretor nas escolas públicas de educação básica. O resultado dessa consulta será utilizado para a criação de um programa de valorização de diretores de escolas públicas de ensino básico municipais, estaduais e federais de todo país. A participação está aberta até o dia 02 de março.
Imediatamente após o término do prazo, todas as sugestões serão sistematizadas, analisadas e servirão de base para um debate público sobre a criação do programa. Por meio dessa iniciativa, diretores de escolas públicas de grande porte poderão fazer cursos de qualificação e, em troca, ter acesso a um bônus mensal pago pelo Ministério da Educação (MEC). A ideia é oferecer a esse público uma capacitação em gestão administrativa e financeira, além da abordagem de questões pedagógicas. A adesão do diretor será voluntária. O pagamento do benefício fica condicionado ao desempenho em avaliação aplicada ao fim do curso. O valor ainda não foi definido, mas possivelmente vai variar de acordo com a formação dos gestores: aquele que possui título de mestre, por exemplo, pode ter um bônus mais robusto. Hoje, não há estatísticas oficiais sobre a formação dos diretores: o dado coletado no censo escolar é restrito aos que atuam em sala de aula.
Inicialmente, o foco são as escolas com mais de 500 matrículas, que limita o escopo do programa. De acordo com dados oficiais, do total de 118.916 escolas públicas de ensino fundamental, 14.728 (12,4%) têm esse perfil. Já no ensino médio, são 1.409 unidades, de um total de 3.730 (37,7%). Algumas escolas, no entanto, podem ter sido contabilizadas duas vezes: ofertam as duas etapas e têm mais de 500 estudantes em ambas. Os números são do censo de 2013.
O ministro anunciou que pretende promover alterações no Exame Nacional de Ensino Médio (Enem), tornando-o totalmente online, agendado pelo aluno. Com a novidade, Cid Gomes pretende criar para cada área um banco digital de questões com cerca de 8 mil perguntas, que será uma espécie de fonte de estudos e de aprimoramento de conhecimentos, totalmente aberta ao público. As provas online serão exclusivas, compostas por questões do banco e não uma “operação de guerra” que caracteriza o modelo como o atual.
O ministro prometeu apoiar o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) com a garantia da ocupação de 12 milhões de vagas até o final dos próximos quatro anos, visando à qualificação dos jovens para o mercado de trabalho.
Prometeu ainda ampliar e fortalecer o “Programa Ciência sem Fronteiras”, que concede bolsas de estudo para universitários no exterior. O projeto causou polêmica no começo de 2014 por excluir da lista de beneficiados os cursos de ciências humanas. Em 2015, o programa tem como meta conceder 101.000 bolsas, das quais 75.000 serão financiadas com recursos do Governo Federal e 26.000 com recursos da iniciativa privada.
Cid Gomes tem mostrado interesse em outros temas tais como a valorização da diversidade do povo brasileiro, garantindo a inclusão e a melhoria na educação no campo e na cidade, de índios e quilombolas e daqueles que mais precisam de uma atenção especializada.
No que se refere ao Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), o ministro afirmou no dia 5 de fevereiro que o sistema só será reaberto para novos contratos depois de concluída a negociação do MEC com as instituições particulares de ensino superior. Mesmo sem fixar um prazo, Gomes assegurou que a reabertura acontecerá ainda em 2015 e que, para este ano, novas vagas serão abertas. Quantas, e quando, dependerá do entendimento entre os envolvidos. Afirmou que, a partir deste ano, o Fies continuará oferecendo financiamento aos estudantes, mas sem atender a uma oferta espontânea – a quantidade de novos contratos do Fies aumentou quase dez vezes entre 2010 e 2014. “Queremos casar oferta e demanda, e associar a isso qualidade.”
Segundo Cid Gomes, o MEC discute atualmente como voltar a receber novos contratos de financiamento pelo Fies, de forma mais organizada, para evitar que a demanda chegue de maneira aleatória por parte dos estudantes, e para assegurar que esteja vinculada aos cursos de comprovada qualidade. Cid Gomes informou que essas questões estão sendo discutidas com o setor e, internamente, com os técnicos do Ministério da Educação, com o objetivo de priorizar qualidade como pré-requisito fundamental e, na sequência, de forma mais organizada, abrir novas matrículas.
Segundo o ministro, o governo federal ainda tem uma demanda para aumentar o acesso à universidade, mas considera que o déficit educacional no ensino superior não é tão grande quanto nos anos anteriores. Por isso, ele diz que o Fies passará a ter o mesmo perfil dos outros programas do MEC para esse nível de ensino, incluindo o Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que seleciona estudantes para vagas em instituições públicas, e o Programa Universidade para Todos (ProUni), que dá bolsas parciais e integrais de estudo em instituições privadas.
Segundo os cálculos do MEC, somando as duas edições anuais do Sisu e do ProUni, o governo federal deve oferecer, neste ano, cerca de 520 mil vagas no ensino superior. Para aumentar essa oferta, Cid Gomes pretende seguir com o programa de expansão das instituições públicas e modificar o sistema de oferta de contratos do Fies. Segundo o ministro, o aumento da oferta deverá ser feito com base no entendimento e não na oferta espontânea, isto é, combinar oferta e demanda associada à qualidade.
A discussão também envolve a negociação com as próprias universidades, faculdades e centros universitários particulares, que criticaram as novas medidas para o Fies anunciadas pelo governo no fim de dezembro. "O ministério é o contratante, e as instituições privadas de ensino superior são as contratadas. Então há que haver uma negociação entre contratante e contratada, pautada principalmente pela questão de qualidade", afirma o dirigente do MEC.
Concluindo...
O setor privado de ensino superior compartilha de uma forma geral das prioridades e das propostas do ministro Cid Gomes e se apresenta, nesse momento de grandes dificuldades enfrentadas pelo país, como um potencial parceiro para o desenvolvimento da educação brasileira. Parceiro na verdadeira concepção da palavra: reconhecido, valorizado e tendo suas reivindicações atendidas. A parceria tem que ser boa para os dois lados, condição sine qua non para avançar.
No entanto, há que se destacar um aspecto para o qual o setor privado clama por uma posição do MEC. Percebe-se, pelas declarações recentes do ministro, que ele ainda não se deu conta das dificuldades que vêm sendo enfrentadas pelas instituições de ensino superior, sobretudo as de pequeno e médio porte, no que se refere às restrições feitas às políticas públicas na área da educação. Em outras palavras, o Governo caminha na contramão dos compromissos assumidos durante o processo eleitoral.
Os impactos das medidas introduzidas nas regras do Fies, por exemplo, impõem a necessidade de adoção, por parte do MEC, de providências em curto prazo. Se houver restrições para o acesso das classes “C” e “D” ao ensino superior, dificilmente as metas do PNE serão alcançadas. O Governo estimulou nos últimos anos as instituições a expandirem ao máximo as matrículas de alunos com financiamento do Fies, sem limites ou restrições nos valores a serem contratados. Os alunos que recorrem ao programa são os menos favorecidos economicamente e, por essa razão, ficarão limitados para solicitar o crédito. Sem Fies e sem vagas nas universidades públicas, qual o destino dos candidatos ao ensino superior provenientes das classes “C” e “D”? Atualmente os que têm mais recursos se preparam melhor para o Enem e vão para as universidades públicas. Os que têm menos condições financeiras nem ao menos poderão contar com o Fies.
Para os alunos matriculados e para os ingressantes, passou a pairar a enorme incerteza se o programa vai ser mantido e se as instituições vão continuar a ofertá-lo. Um grande contingente de alunos e professores não tem hoje perspectivas sobre o futuro do programa.
Outro aspecto chama a atenção: perguntado em entrevista ao Valor Econômico[3] se ele teria conhecimento da situação precária das universidades federais, Cid Gomes, surpreendente e inusitadamente respondeu: “Essa é uma discussão para o país. Não vou virar palmatória do mundo. Tenho agendas mais importantes, mais emergentes, digamos assim”.
Como assim, Senhor Ministro?
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