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Aloizio Mercadante toma posse no Ministério da Educação. Veja o pronunciamento

24/01/2012 | Por: MEC | 2654

PRONUNCIAMENTO

POSSE NO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

Autoridades Presentes (a nomear), Senhoras e Senhores,

Há cerca de um ano, tomei posse, com grande motivação e entusiasmo, do cargo de Ministro da Ciência e Tecnologia do governo Dilma Rousseff, a primeira mulher a governar o Brasil.

Assim como naquela ocasião, devo dizer que é uma honra pertencer à equipe da Presidenta Dilma. Com sua reconhecida competência e capacidade de gestão, ela vem fazendo um notável governo, que está aprofundando o processo de desenvolvimento econômico e social iniciado pelo ex-presidente Lula. Não tenho dúvida de que a presidenta Dilma Rousseff, por sua competência técnica, coragem pessoal e inquebrantável espírito público, está deixando marca indelével na história do país, honrando, dessa forma, todas as mulheres brasileiras.

Tenho também de tornar público meu reconhecimento ao companheiro, Ministro Fernando Haddad, que será lembrado, da mesma forma, pela história, como um dos melhores ministros da Educação que o Brasil já teve. É, ao mesmo tempo, uma grande honra e um grande desafio substituí-lo.

Quando tomei posse como Ministro da Ciência e Tecnologia, mencionei que tinha grande afinidade com a área temática daquele Ministério.

Pois bem, reitero agora, com ênfase ainda maior, o que afirmei há um ano.

Ocupei vários cargos importantes no Legislativo e estava, até ontem, Ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação. Estou, a partir de agora, Ministro da Educação. Mas sou, acima de tudo, um economista e professor. Essa é a minha verdadeira identidade. Todos os cargos que ocupei, tudo o que fiz; fiz com base nessa profunda e definitiva identidade.

Desde 1978, sou professor, na PUC e na Unicamp. Fui presidente da Associação dos Professores da PUC-São Paulo, sou fundador e primeiro vice-presidente da Andes e me dediquei, em tempos muito difíceis, a lutar por melhores condições de trabalho para a categoria, sempre em defesa da educação universal e de qualidade. Minha companheira, Regina, foi professora do ensino fundamental por mais de 20 anos. Nos últimos 10 anos, dedica-se à educação na favela de Heliópolis. Lá em casa respiramos educação e, no trabalho, já respiramos muito pó de giz.

 

Essa longa trajetória na pesquisa e no magistério me preparou para todos os desafios que enfrentei na minha vida pública. Parafraseando Gilberto Gil, diria que “o magistério já me deu, graças a Deus, régua e compasso”.

Na realidade, tal trajetória me preparou para a vida, em todos os sentidos. Provavelmente até mais do que isso, pois como bem assinalou John Dewey, destacado filósofo e educador norte-americano:

“A educação não é apenas a preparação para a vida; é a vida em si mesma.”

Tenho muito orgulho de ser professor. O professor é aquele que estimula a inteligência, a curiosidade, que desperta nos alunos a sede por conhecimento e o espírito crítico que esclarece e ilumina, que semeia nas crianças e nos jovens os valores da democracia, da cidadania, do respeito ao próximo e à natureza. O professor é aquele que transmite o que a sociedade tem de melhor. O professor é aquele que liberta da pior forma de escravidão, que é a escravidão gerada pela ignorância.

Sei bem, por conseguinte, da importância dos servidores da Educação e dos professores e, mais ainda, da extrema relevância de recuperar a dignidade dessas profissões estratégicas para o futuro do Brasil. Não iremos a lugar algum sem bons professores, sem um magistério bem estruturado, motivado e profissional, desde a educação infantil até a educação superior. Por isso, à frente do Ministério da Educação continuarei a luta da minha juventude pela dignidade dos professores.

Esse é um compromisso de vida que assumo, agora, como compromisso público!

Como todos sabem, nesse período histórico recente, o Brasil avançou muito, distribuindo renda e oportunidades e dando largos passos para eliminar a miséria, um objetivo que a Presidenta Dilma está empenhada em alcançar. O país combina, hoje, num processo sinergético virtuoso, crescimento econômico com distribuição de renda e eliminação crescente da pobreza extrema. Mesmo em plena crise mundial, temos sólido equilíbrio macroeconômico e inflação sob controle. Há plena vigência das instituições e das liberdades democráticas, principalmente às relativas à liberdade de expressão e de imprensa. E o Brasil tem, hoje, protagonismo internacional de primeira grandeza, inclusive no que tange à agenda ambiental e à implantação de uma economia verde e criativa.

As nossas vantagens comparativas são, pois, amplas e diversificadas e nosso potencial de crescimento, enorme. Não obstante, tenho convicção absoluta de que esse potencial não se realizará se não continuarmos a enfrentar, com decisão e absoluta prioridade, a nossa principal fragilidade como nação: a ausência de uma educação universal de qualidade.

Na realidade, tal fragilidade pode comprometer tudo o que conseguimos fazer até agora e tudo aquilo que poderíamos alcançar, no futuro.

No Manifesto dos Senadores pela Educação, uma iniciativa do Senado Federal e da Unesco que liderei em 2004, já dizíamos:

“Só uma política de Estado que reconheça o potencial da educação será capaz de superar as contradições e as barreiras que continuam a impedir a construção de uma sociedade mais ampla e inclusiva. É preciso que todas as mentes desse país, conscientes de suas responsabilidades perante um quadro anacrônico que ainda nos oprime, construam, pela efetivação de uma educação básica de qualidade, os marcos que ajudem a resgatar uma dívida social antiga e projetem o país em direção a cenários mais promissores em termos de democracia e modernidade social.” Estamos obtendo êxito na superação da miséria, mas precisamos ter êxito também na erradicação da mais insidiosa forma de pobreza: a pobreza de conhecimentos, que impede, em longo prazo, processos sustentados de desenvolvimento econômico e social. Que impede, na realidade, a construção do futuro.

Temos avançado muito, sem dúvida. Mas o Brasil, embora tenha emergido definitivamente no cenário mundial, não é ainda um país desenvolvido! E o que é um país desenvolvido? Há muitas definições, muitas variáveis a considerar. No entanto, para mim, a principal variável é a educação. Assim como um país rico é um país sem pobreza, um país desenvolvido é fundamentalmente aquele capaz de prover educação universal de qualidade.

Protágoras dizia que o homem é a medida de todas as coisas. Pois bem, a medida do desenvolvimento de um país deve ser, essencialmente, a medida da educação de sua população. Foi essa riqueza fundamental, essa riqueza fundadora de outras riquezas, que permitiu à Alemanha e ao Japão, destroçados após a Segunda Guerra Mundial, alcançarem, em poucas décadas, os mais altos postos no concerto das nações.

Os chineses, que estão investindo maciçamente em educação e em ciência e tecnologia, dizem: “Se planejas para um ano, planta arroz. Se planejas para uma década, planta árvores. Mas se planejas para toda uma vida, educa tuas crianças.”

Somente a educação de qualidade pode gerar um horizonte de longo prazo para o desenvolvimento e dar sustentáculo às políticas de distribuição de renda, pois as desigualdades educacionais são as que originam e reproduzem as nossas ainda profundas desigualdades sociais. Há limites para o que as políticas sociais compensatórias podem fazer, mas não há limites para o que a educação de qualidade para todos pode alcançar como elemento indutor de uma efetiva igualdade.

Infelizmente, até tempos recentes, nosso país não dava a devida prioridade à educação universal e de qualidade.

Desde a catequese jesuítica, passando pela reforma pombalina, até chegar ao final do século passado, o Brasil não fez, na escala necessária, os investimentos imprescindíveis para assegurar a todos seus cidadãos uma educação de qualidade.

Ao contrário de outras nações, não demos a devida relevância à educação. Com efeito, pode-se constatar que, quando surgiu a primeira universidade norte-americana, a de Harvard, fundada em 1638, a América espanhola já dispunha de 13 instituições de ensino superior. Em contrapartida, a primeira autêntica universidade brasileira só apareceria em 1922. Temos, assim, um significativo atraso histórico, que precisamos reverter em pouco tempo.

Essa falta de efetiva prioridade à educação na história do país refletiu-se em índices de investimento nas políticas e atividades da área que ainda são inferiores aos dos países mais desenvolvidos. Na educação básica, segundo dados da OCDE, o nosso gasto por estudante era de aproximadamente US$ 2.416, em 2008. Esse gasto era seis vezes inferior ao dos Estados Unidos, cinco vezes inferior ao da Dinamarca, quatro vezes menor do que o da França e três vezes menor do que o da Coreia do Sul.

Evidentemente, nesse longo período histórico, importantes progressos ocorreram, sobretudo pelo discernimento e esforço de grandes educadores brasileiros, como Anísio Teixeira e Fernando de Azevedo, dois dos maiores idealizadores do seminal Manifesto pela Educação Nova, de 1932.

No entanto, tais esforços pontuais, embora brilhantes, não conseguiram gerar o sonhado sistema educacional que deveria resgatar vastas parcelas da população brasileira dos grilhões da ignorância, que tanto escravizam, e da cidadania rala, que limita irremediavelmente o usufruto de todos os direitos, tanto civis e políticos, quanto sociais e econômicos.

Com a Constituição de 1988, foi dado, porém, um passo fundamental para a superação desses problemas históricos, ao se instituir, pela primeira vez, a educação pública de qualidade como um direito de todos os cidadãos.

Ao longo da década de 90 do século passado, especialmente nos governos de Fernando Henrique Cardoso, houve também progressos significativos, como a prioridade ao ensino obrigatório, a expansão do número de matrículas no ensino fundamental, a criação dos primeiros sistemas nacionais de avaliação da qualidade de ensino, o aumento da escolaridade e a criação do Fundef.

Entretanto, foi a partir do governo Lula, notadamente na gestão de Fernando Haddad, que se delineou uma visão sistêmica da educação. E a democratização do acesso à educação de qualidade em todos os níveis tornou-se efetivamente uma prioridade. A educação passou a ser tratada como um sistema articulado, da creche ao ensino superior.

A criação do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), que substituiu o antigo e limitado Fundef, teve papel de relevo nesse novo quadro. Com efeito, o novo fundo, criado em 2006, estendeu a destinação dos recursos às demais etapas e modalidades da educação básica, em sintonia com uma visão sistêmica da educação, o que reabriu o caminho para a progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade nas áreas de educação infantil, ensino médio e educação de jovens e adultos.

Ressalte-se que os aumentos dos aportes ao Fundeb refletiram-se na evolução do orçamento anual do Ministério da Educação, que mais do que quadruplicou, ao passar de R$ 19,1 bilhões, em 2003, para mais de R$ 85 bilhões, em 2012.

Outra iniciativa relevante foi o estabelecimento, por iniciativa do Poder Executivo, de um piso salarial para os profissionais da rede de ensino básico da União, Distrito Federal, estados e municípios. A partir daí, os inúmeros valores deram lugar ao piso nacional dos professores. Trata-se de um avanço importante, que tende a elevar e a equalizar regionalmente os salários dos professores da rede pública.

Na condição de Ministro da Educação, pretendo iniciar um diálogo amplo para que todos os estados e municípios assegurem a implantação do piso nacional e realizem os esforços necessários para a melhoria da remuneração e das condições de trabalho do magistério e dos demais trabalhadores da educação.

Temos, todos juntos, de romper definitivamente com esse círculo vicioso, que havia no passado, de baixos salários, carreira de magistério desestruturada e desprestigiada e professores desmotivados, que conduzia à educação de baixa qualidade, a estudantes sem estímulos e a uma escola que não funcionava como centro dinâmico de difusão de conhecimentos.

Outro avanço diz respeito ao lançamento do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), que fortaleceu a concepção sistêmica de educação, enfatizando as conexões entre educação básica, superior, profissional, alfabetização e educação de jovens e adultos, e conferiu centralidade à educação no processo de desenvolvimento econômico e na redução das desigualdades sociais.

Na educação básica, foram lançados ou reforçados muitos programas de apoio às escolas e aos professores. Eles vêm mudando, de forma significativa, o quadro da qualidade do processo pedagógico. Na minha gestão, vamos fortalecer e ampliar todos esses relevantes programas.

Mais importante ainda é observar que, com a instituição da obrigatoriedade da matrícula a partir dos 6 anos de idade em todas as escolas do país, ampliou-se o ciclo do ensino fundamental de 8 para 9 anos e elevou-se a escolaridade obrigatória das crianças. Em nossa gestão, o Ministério da Educação, em colaboração com estados e municípios, continuará a desenvolver os melhores esforços para que, até 2016, todas as crianças e jovens, a partir dos 4 anos de idade, até os 17 anos, estejam na escola, conforme determina a Constituição Federal.

Quanto ao ensino médio, deve-se ressaltar a extraordinária expansão da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, que foi duplicada. Em menos de 10 anos, os governos Lula e Dilma fizeram mais do que foi feito em todo o século passado.

O recente lançamento do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) dará novo impulso ao ensino técnico brasileiro e à qualificação profissional, gerando oportunidades de empregos a milhões de jovens brasileiros. Esse será um dos mais importantes objetivos estratégicos de minha gestão.

Destaque-se que a rede dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia tem um papel fundamental no salto de qualidade do ensino médio profissionalizante. Ela deve contribuir para torná-lo mais atraente aos jovens, certificar boas instituições privadas e elevar o nível pedagógico dos cursos.

Nosso compromisso é continuar a trabalhar para dotar o ensino médio de qualidade compatível com as exigências postas à juventude brasileira, tornando-o, a um só tempo, relevante, atraente e capaz de fornecer solida formação para a plena cidadania.

Em relação ao ensino superior, cabe destacar o ProUni, que se tornou o maior e mais bem-sucedido programa de bolsas de estudos da história do país, com a distribuição de aproximadamente 1 milhão de bolsas a jovens carentes. Também é oportuno lembrar a expressiva criação de universidades federais (14 ao todo, entre 2003 e 2011) e o fantástico aumento das matrículas no ensino superior federal, de 531 mil, em 2002, para mais de 1 milhão, em 2010.

Contudo, temos de desenvolver uma política adequada de planejamento e supervisão da expansão do ensino superior brasileiro, de forma a induzir resultados estratégicos nos setores e áreas de maior interesse do país. As instituições privadas de ensino superior estão tendo papel decisivo na expansão da oferta de vagas nas universidades e já respondem por cerca de 75% das matrículas. Por isso, é muito importante que o MEC busque formas de assegurar a qualidade da educação superior, bem essencial para a população e o país. Nesse sentido, a nova tendência de fusão e concentração do ensino particular em grandes grupos econômicos, bem como a abertura dos capitais desses grupos nas bolsas de valores, demandam forte sistema de avaliação, regulação e supervisão. Não podemos perder a gestão estratégica de nossos recursos humanos.

A esse respeito, cabe assinalar a necessidade de o Brasil investir mais na formação de quadros em profissões fundamentais para o nosso desenvolvimento tecnológico e industrial, como as engenharias. Temos, por diversos motivos, grandes carências nessa área, as quais precisam ser prontamente revertidas. Ainda no campo do ensino superior e da pós-graduação, é preciso destacar a criação do Ciência sem Fronteiras, um fantástico programa que está distribuindo 100 mil bolsas de estudos de graduação, doutorado e pós-doutorado para que os mais destacados estudantes brasileiros aperfeiçoem sua formação nas melhores universidades do mundo. O programa já é um sucesso. Tivemos mais de 20 milhões de acessos às páginas do seu portal e, além dos 1.500 estudantes já aprovados, já temos mais de vinte e oito mil inscritos para a segunda fase de avaliação.

Mas esse programa também tem o caminho inverso: estamos atraindo talentos que estão no exterior, desde jovens doutores até detentores de prêmios Nobel, para que venham pesquisar no Brasil. Nosso objetivo não é exportar cérebros, como ocorria no passado, mas sim trazer talentos e inteligências, internacionalizar a ciência brasileira e tornar nossas universidades instituições de prestígio mundial.

Esses avanços são muito significativos, sem dúvida; e nos orgulham. Porém, é preciso constatar que ainda temos tarefas monumentais a cumprir para termos instituições superiores de ensino que sejam decisivas para a implantação de uma verdadeira sociedade do conhecimento no Brasil. De fato, mesmo com os progressos recentes, nossa qualidade de ensino, quando comparada à de países desenvolvidos, ainda apresenta deficiências.

Há estatísticas que ainda inquietam. Por exemplo, entre os jovens de 16 anos que fazem parte da população 20% mais pobre, apenas 40% concluíram o ensino fundamental. Entre os jovens de 18 anos, somente 37% concluíram o ensino médio. A educação superior, mesmo com os avanços recentes em relação à oferta aos mais pobres, só é acessível à cerca de 15% dos jovens entre 18 e 24 anos, enquanto na Coreia do Sul tal índice é de 82%. E os nossos jovens do ensino fundamental e médio ainda ocupam posições insuficientes nos testes internacionais de avaliação de rendimento, apesar da boa evolução recente, que fez o Brasil destacar-se como o terceiro país que mais progrediu nos testes do Pisa, nos últimos 10 anos.

Ante tal quadro, e levando em consideração as exigências impostas por um mundo cada vez mais competitivo e por uma economia que crescentemente se assenta na inovação tecnológica e no conhecimento, a questão que inexoravelmente se coloca a este Ministério, ao Estado brasileiro, à sociedade brasileira e a cada cidadão deste país, é se podemos nos mobilizar e nos empenhar em produzir um salto histórico que eleve nosso patamar rapidamente a um nível bem mais alto. Devemos nos contentar com progressos incrementais ou devemos ousar, criar, inovar e dar um salto de qualidade que aproxime, em tempo histórico reduzido, nosso sistema educacional daqueles dos países mais desenvolvidos?

Sei que se trata de um monumental desafio, mas acredito que, reunindo forças, podemos dar esse salto. Mais do que isso, temos de dar esse salto, caso queiramos ter competitividade internacional em todos os campos e assegurar nosso desenvolvimento em longo prazo, com inclusão social.

A hora é agora. Temos de aproveitar o bom momento que vive o Brasil e tomar decisões ousadas que mudem substancialmente, e de forma irreversível, a qualidade de nossa educação.

Para tanto, precisamos, em primeiro lugar, fazer um grande pacto nacional pela educação. Um pacto que envolva as famílias, os empresários, a sociedade civil como um todo e os governos municipais, estaduais e federal.

De fato, a educação precisa se transformar numa espécie de saudável obsessão nacional, que nos mobilize a todos. E aos governos cabe assentar essa grande mobilização nacional numa sólida política de Estado, estratégica, ambiciosa e de longo prazo, de caráter inteiramente suprapartidário. Por isso mesmo, a minha gestão à frente deste Ministério não será um trampolim para projetos pessoais ou partidários. Será, sim, uma alavanca suprapartidária para a melhoria da educação brasileira. Assim como aconteceu no Mistério da Ciência, Tecnologia e Inovação, minha equipe será composta pelos critérios da competência e da dedicação à coisa pública. A quem vier, não perguntarei por partidos ou ideologias, mas demandarei, com rigor, competência técnica, espírito público e comprometimento com o país.

Em segundo lugar, temos de fazer com que essa grande mobilização se traduza na continuidade dos esforços pela ampliação expressiva, mas responsável, dos investimentos na educação brasileira, de forma a elevá-los progressivamente aos níveis dos países mais desenvolvidos. Precisamos ter, como meta suprapartidária, aumentar a participação da educação, em relação ao PIB, para fazer frente aos grandes desafios da implantação de uma sociedade do conhecimento no Brasil.

Nesse ponto, assim como em outros, levaremos também em consideração as recomendações emanadas da Conferência Nacional da Educação, de 2011. Na realidade, os documentos elaborados naquela importante conferência servirão de fonte de constante inspiração para minha gestão.

Felizmente, podemos usar os fantásticos recursos do pré-sal para tal finalidade. Defendo que parte expressiva dos royalties do pré-sal sejam destinados à educação, ciência e tecnologia, de modo a que possamos elevar mais rapidamente os investimentos que nos permitirão dar um salto de qualidade irreversível em nossa educação e em nossa capacidade de inovar. O petróleo é recurso não-renovável. Portanto, não estará disponível às futuras gerações. Nossa missão é utilizar tais recursos com responsabilidade e critérios intergeracionais, de modo a criar as bases que deem sustentabilidade ao nosso desenvolvimento econômico e social.

Entretanto, independentemente dessa ampliação dos investimentos em educação, temos de continuar melhorando muito a gestão e fazer mais com o que temos.

Em relação ao Enem, temos de aprofundar os esforços para aprimorar sua aplicação. Um grande desafio, num exame que envolve 5 milhões de alunos e 400 mil pessoas trabalhando num único dia.

É preciso reconhecer que há um tensionamento, em relação ao Enem, dado o fato de que tal exame tornou-se classificatório e eliminatório para milhões de jovens brasileiros, mas temos de preservar e consolidar esse mecanismo, que, em perspectiva, é muito mais adequado, democrático e republicano do que a antiga proliferação dos vestibulares. Ele é o grande instrumento para a democratização do acesso ao ensino superior, mediante o ProUni, o Fies e o Sisu. Ele é a vital porta de acesso, que tende a igualar a distribuição de oportunidades que o ensino superior dá aos jovens brasileiros. Pretendo realizar ampla consulta com especialistas de alto nível, com os reitores da Andifes e do Conif e os profissionais do Inep e da Abruem, para buscar soluções que melhorem a eficiência e reforcem o caráter republicano e democrático do Enem e dar mais oportunidades para os jovens brasileiros que queiram ingressar no ensino superior.

Também temos de fazer mais para combater o problema da repetência escolar, que contribui decisivamente para a evasão de jovens do sistema educacional.

Há casos preocupantes de crianças que, embora já estejam no quarto ou no quinto ano do ensino básico ainda não sabem realmente ler e escrever ou fazer operações matemáticas básicas. Como elas poderão adquirir novos conhecimentos em outras áreas se não dominam a leitura do português e a linguagem lógica básica da matemática?

Para melhorar o acompanhamento pedagógico, será necessário aproveitar o potencial dos estudantes de licenciatura que estão se aperfeiçoando e fazê-los realizar, sempre orientados por professores experientes, estágios nas escolas públicas, principalmente no que diz respeito ao aprendizado do português e da matemática, dois campos cognitivos que servem de base para toda a educação posterior. Assim como na área da medicina, na qual há a residência médica, vamos criar uma espécie de residência dos licenciandos, ampliando as bolsas para iniciação à docência, que será um instrumento de enorme valia para o acompanhamento pedagógico nas escolas públicas e para a formação dos futuros professores. Os licenciandos poderão também apoiar as atividades regulares dos professores já graduados, ao visitar famílias e ao induzir o maior engajamento dos pais no processo pedagógico.

No mesmo diapasão, precisamos ampliar o programa Mais Educação, de modo a avançar na implantação da escola em tempo integral, pois a experiência internacional demonstra que há uma correlação estreita entre a qualidade da educação e a ampliação da jornada escolar.

É preciso entender que, na escola, tudo começa na sala de aula. O foco do aprendizado tem de estar, portanto, nesse local onde se constrói a relação professor-aluno, a complexa e delicada base de todo o processo educativo. Se algo falha nesse processo nos primeiros anos letivos, cria-se uma lacuna pedagógica de difícil reversão. Os alunos ficam desmotivados e tendem a abandonar a escola.

Para combater essa séria deficiência, vamos lançar o programa Alfabetização na Idade Certa, em parceria com municípios e estados. Esse novo programa complementará o Pró-Letramento, um bom programa que o MEC já desenvolve, e atuará distribuindo material didático adequado e bem estruturado, estimulando de forma criativa o hábito de ler, avaliando permanentemente os resultados alcançados e direcionando os melhores recursos para essa fase crítica do aprendizado. Dessa forma, as melhores salas de aula, os melhores turnos e os melhores professores estarão à disposição das crianças, para que elas possam se alfabetizar até a idade máxima de 8 anos e prosseguir seus estudos sem lacunas e rupturas pedagógicas.

Com o mesmo objetivo, também temos de investir mais na educação infantil. As pesquisas da neurociência comprovam que, entre zero e 6 anos de idade, a criança desenvolve a base neuronal que sustentará o aprendizado pelo resto de sua vida. Portanto, quaisquer comprometimentos emocionais, nutricionais, sociais ou pedagógicos nessa fase decisiva do desenvolvimento do cérebro, têm consequências graves para o desenvolvimento cognitivo, psicológico e social da criança. Portanto, temos de ampliar nossos horizontes e pensar, com responsabilidade, na base da educação básica, que é a pré-escola. Com creches e pré-escolas adequadas, superaremos muitos dos problemas de aprendizado de nossas crianças. Por isso, vamos cumprir a meta de criar mais de 6 mil creches e pré-escolas e dar às crianças brasileiras em fase pré-escolar acolhimento afetivo, nutrição adequada, atividades pedagógicas estimulantes e material didático que as preparem para a alfabetização. Em todo esse processo, daremos apoio integral à imprescindível formação dos professores.

Outro programa que implantaremos com absoluta prioridade em nossa gestão será o destinado a suprir as carências da educação na área rural do Brasil. Como bem afirmou o Ministro Fernando Haddad, a dívida educacional no campo ainda é muito grande. Vamos, então, lançar esse programa fundamental que organizará federativamente as interfaces necessárias para enfrentar o problema.

Ainda com o intuito de melhorar a qualidade da nossa educação, implantaremos a Prova Nacional para Docentes e, com ela, oferecer aos municípios a contratação de bons professores, concursados. Vamos, com prefeitos e representantes da classe dos professores, estudar a possibilidade de conceder incentivos que induzam ao deslocamento e à permanência dos aprovados nos municípios com menor Ideb e nas áreas críticas das periferias dos grandes centros urbanos, nas quais estão concentradas as carências educacionais e os jovens que mais precisam de acompanhamento pedagógico.

A qualidade da educação nunca poderá ser superior à qualidade do professor. Daí a importância crucial de investir na qualidade da formação e na carreira desse que é o agente central e insubstituível do processo pedagógico.

Caro Ministro, senhoras e senhores,

Nossos desafios são gigantescos. Com efeito, não será fácil superar, em pouco tempo, as deficiências seculares da educação brasileira. Contudo, para agilizar a superação desses desafios, podemos usar instrumentos modernos, que estão à nossa disposição, como as tecnologias de informação e comunicação (TICs).

Embora seja metodologicamente difícil estabelecer nexo causal entre o uso dessas tecnologias e a performance escolar, dados os inúmeros fatores intervenientes no processo educativo, há diversas pesquisas que indicam que elas podem fazer grande diferença na sala de aula. Algumas dessas pesquisas, citadas em relatório da Comissão Europeia de 2006, são bastante elucidativas, embora não conclusivas. Elas indicaram que o uso das TICs melhora o desempenho dos alunos das escolas primárias no aprendizado da língua e de ciências e aumenta significativamente a performance dos alunos de nível médio em ciências e tecnologia.

Ademais, o uso adequado dessas novas tecnologias propicia e estimula o aprendizado independente por parte dos alunos, o que facilita a adequação dos conteúdos programáticos às necessidades individuais dos estudantes, inclusive daqueles que têm dificuldades de aprendizado. Verificou-se também, e isso é extremamente importante, para nós, brasileiros, que a redução da divisão digital entre os estudantes contribui sensivelmente para minimizar a divisão social nas escolas.

Na realidade, o uso adequado dessas novas tecnologias permite maior interatividade e autonomia no aprendizado, maior personalização dos conteúdos didáticos e do processo pedagógico, reduz custos na disseminação da educação de qualidade e põe à disposição de professores e alunos um universo muito amplo e diversificado de conhecimentos. Em virtude dessas constatações, União Europeia, Japão, Coreia do Sul e outros países desenvolvidos já fazem fortes investimentos no uso dessas novas tecnologias nas escolas.

Por isso mesmo, acredito que, no Brasil, temos de redobrar os esforços destinados à superação da divisão digital que tende a reproduzir e acentuar as desigualdades sociais e regionais. Devemos ampliar e intensificar os esforços que o Ministério da Educação e outros órgãos públicos vêm fazendo para introduzir as novas tecnologias nas escolas públicas, não apenas por meio da oferta de equipamentos, como computadores, tablets e laptops, mas também mediante a oferta crescente de conteúdos pedagógicos adequados em meios digitais.

Evidentemente, a educação de qualidade exige, acima de tudo, professores bem pagos, formados e motivados, recursos pedagógicos adequados, instalações apropriadas, envolvimento dos pais com a escola e um ambiente cultural voltado para o aprendizado.

Porém, o uso de novas tecnologias pode acelerar o processo de melhoria do ensino, seja como ferramenta para a formação de professores e o desenvolvimento de atividades didático-pedagógicas, seja como instrumento de aprendizagem escolar. A tecnologia da informação e comunicação não é um fim em si mesmo, mas a inclusão digital massiva das escolas públicas, com participação pedagógica ativa dos professores, deve contribuir significativamente para propiciar o salto de qualidade tão necessário ao sistema educacional brasileiro.

Não se trata, como apregoa certa visão atrasada do tema, de substituir o investimento no professor pelo investimento no computador, mas de propiciar a mestres e alunos novos instrumentos que acelerem e aperfeiçoem o aprendizado e melhorem a gestão escolar. A bem da verdade, o investimento nessas novas tecnologias é também, e acima de tudo, um investimento no professor e para o professor. Um investimento que o atualiza e renova.

O professor moderno tem de saber lidar com esses novos instrumentos, para acompanhar um mundo em constante mutação, a incrível velocidade da propagação dos novos conhecimentos e as exigências de um novo tipo de aluno. O professor necessita se reinventar, e precisa fazê-lo constantemente. No entanto, nesse processo de modernização e reinvenção, o professor continuará a ser o centro do processo pedagógico. As novas tecnologias substituem apenas o quadro-negro e outros instrumentos antigos. Não substituem o professor. Nada pode substituir a relação professor-aluno, a base mais sólida e completa do aprendizado.

Mas, quando um aluno pobre dos rincões da Amazônia ou do Nordeste tiver acesso, graças a essas tecnologias, aos mesmos conteúdos pedagógicos, às mesmas aulas, aos mesmos recursos educacionais que um estudante de um bairro nobre de São Paulo, o Brasil terá dado um passo gigantesco para a melhoria do seu sistema educacional e para a democratização das oportunidades.

Sei que, para inovar, para competir, é necessário educar. Mas também tenho a consciência cada vez mais clara de que, para educar, nesse mundo tão complexo, competitivo e mutável, é necessário inovar.

Educar para inovar e inovar para educar. Esse é o grande desafio que o país tem de enfrentar.

Estou certo de que, quando cada escola pública do Brasil se transformar num pequeno centro de excelência, com o uso adequado de tecnologias inovadoras e avançadas e com professores bem preparados e motivados, o Brasil terá vencido, de forma irreversível, o desafio do desenvolvimento.

Em nosso país, temos de enfrentar, ao mesmo tempo, pendências típicas do século 20, como a implantação da educação de qualidade para todos, com os desafios do século 21, como a geração massiva de ciência, tecnologia e inovação. E temos de fazê-lo criando as sinergias imprescindíveis entre esses tempos históricos distintos. Precisamos queimar etapas. Temos de fazer que os desafios do futuro nos libertem das pendências do passado.

Não podemos esperar. O Brasil já se tornou a sexta economia mundial, tirando o lugar que pertencia ao Reino Unido. Porém, não melhoraremos de posição e não consolidaremos nosso desenvolvimento se não ousarmos, se não inovarmos, se não pensarmos grande, se não pensarmos o futuro a partir da educação.

Ministro Fernando Haddad, senhoras e senhores,

O notável poeta e escritor britânico G.K. Chesterton tem uma frase forte e bela sobre a educação que quero aqui reproduzir. Escreveu ele:

“A educação é simplesmente a alma de uma sociedade a passar de uma geração para outra.”

Pois bem, a alma brasileira é grande e generosa. Estamos, agora, nos tornando uma sociedade cada vez mais inclusiva, baseada na distribuição dos rendimentos e das oportunidades, inclusive das oportunidades que só a educação de qualidade pode proporcionar e nos preparando para a sociedade do conhecimento e a economia verde e criativa, que é a economia do futuro.

A cara do Brasil está mudando e sua alma está se renovando. Quando dermos o salto de qualidade na educação e chegar a hora de o Brasil “mostrar a sua cara”, como dizia outro poeta, o país terá a bela face da igualdade e a alma plena do dever cumprido.

Muito obrigado!


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Áudio: Primeiro discurso de Aloizio Mercadante como ministro da Educação

Data:25/01/2012

Descrição:Ouça o discusso de posse do novo ministro da Educação, Aloizio Mercadante, realizado no dia 24 de janeiro de 2012.

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